A sustentabilidade da sua empresa começa na sustentabilidade das suas relações
Na semana que passou estive de férias com minha família em um resort no litoral norte de São Paulo. Férias são sempre um momento para refletirmos sobre nossas relações de trabalho e recarregarmos as baterias para um novo ciclo que se inicia. Eu sempre tento me desligar de assuntos que possam ter alguma relação com minha atividade cotidiana, mas desde que comecei a trabalhar com Empresas e Direitos Humanos e ESG (há mais de 10 anos) simplesmente não consegui mais me desvencilhar da observância por parte de pessoas e empresas à proteção aos direitos humanos e ao meio ambiente. E claro que, em um local com tantas famílias e tantas pessoas em momentos de lazer e relaxamento, nada mais justo que observarmos as entranhas de muitas relações pessoais.
Na ocasião, pude ver famílias inteiras sem se conversar por nenhum momento enquanto sentadas à mesa para uma refeição. Todos(as) – incluindo muitas crianças – vidrados(as) em seus celulares, em seus universos particulares, sem qualquer interação, cuidado, observância sobre o que cada pessoa gosta, como se comporta e o que quer. Vi crianças e adultos jogando lixo na praia e no mar sem pensarem nas consequências nefastas ao meio ambiente e como os impactos que causamos hoje serão sentidos amanhã. Vi a forma como alguns dos frequentadores do resort tratavam os(as) colaboradores(as) daquela empresa – desde garçons e garçonetes aos(às) funcionários(as) da limpeza e manutenção geral, muitas vezes com desprezo e até mesmo diante de um cenário servil. Vi e ouvi, por fim, comentários homofóbicos por parte de um hóspede a um dos colaboradores – e aqui parabenizo o hotel, que tinha um olhar cuidadoso para a diversidade em seu quadro de funcionários, além de uma preocupação com o meio ambiente, seja por meio da utilização de canudos recicláveis, seja por outras iniciativas de consumo e proteção ao meio ambiente.
Consegui relacionar muitos acontecimentos com os problemas que encontramos em empresas atualmente. A falta de zelo com colaboradores(as) e suas dificuldades e particularidades, a discriminação de gênero, de raça e de identidade de gênero, os olhos fechados para os impactos ao meio ambiente com as atividades desenvolvidas, o lucro pelo lucro, a indiferença para com aqueles(as) que estão todos os dias fazendo um business acontecer e o dinheiro chegar para um dia todos(as) poderem tirar… férias.
Não consegui relaxar como gostaria, confesso, mas, ao mesmo tempo, tive uma certeza: enquanto não cuidarmos das nossas relações mais próximas e da forma como tratamos as demais pessoas e o meio ambiente, muito provavelmente vamos replicar tais arranjos em nossos negócios, em nossos empregos e com nossos(as) colaboradores(as) e colegas diretos de trabalho. Precisamos urgentemente repensar nossa existência e nosso impacto neste planeta: nossas atitudes de hoje ressoam em nossos filhos e em curto, médio e longo prazo, trarão impactos que caminham na contramão ao ideal que temos atualmente de sustentabilidade.
A sustentabilidade começa em nós. Que possamos voltar para um novo ciclo de trabalho com essa clareza e, sobretudo, com este compromisso.
Ana Cláudia Ruy Cardia Atchabahian é advogada formada pela PUC-SP e mestre e doutora em Direito Internacional pela mesma instituição, com foco específico de pesquisa em Empresas e Direitos Humanos e ESG. Professora Universitária e membro da International Law Association - Ramo Brasileiro. Conselheira da Diretoria da Academia Latino-Americana de Direitos Humanos e Empresas e membro da Global Business and Human Rights Scholars Association. Consultora em ESG e Empresas e DH para empresas e órgãos públicos nacionais e internacionais.